sábado, 25 de fevereiro de 2012







Φ  Capítulo  VI : Luto em uma guerra – Gabriel  Φ






     Em Lima, procuramos um hotel e nos hospedamos. Lá, fizemos o levantamento de como estavam os nossos suprimentos. Tínhamos pouco. Teríamos que comprar mais coisas.
    — Não teríamos que voltar para aquela cidade em que entramos no labirinto? —perguntou Arthur.
     — Temos. — respondi — mas temos que comprar suprimentos primeiro. E, depois, descobrir aonde é aquela cidade.
      Saímos do hotel e andamos pela cidade, onde compramos remédios, comidas, a até água. Voltamos para o hotel ao anoitecer.
       — Temos de ir o mais rápido possível — disse eu — vamos amanhã de manhã de avião.
       — Não — discordou Rachel — temos de ir por terra.
       — Por que? — perguntei eu — não podemos perder tempo!
    — Simples. Pode ser que o que seu pai queria que fizéssemos não fosse aonde estávamos mas talvez em outro lugar.
      — É considerável — disse Arthur — é um raciocínio lógico.
      — Vamos por terra então — enfatizou Rachel.
      Fomos dormir. Eu e Arthur em um quarto e Rachel em outro.
     O hotel em que estávamos era simples, porque, por mais que tivéssemos uma ajudinha divina, alguém iria achar estranho três crianças sujas e sozinhas dormirem em um hotel cinco estrelas.
    O quarto em que estávamos tinha as paredes cobertas por um papel da parede de flores. Haviam duas camas de solteiro com colchões finos e um pouco rasgados. O piso era branco, mas todo sujo. Havia um banheiro com uma pia, uma privada e um chuveiro. Era iluminado por lâmpadas incandescentes fracas. Tinha uma janela que dava para uma quadra esportiva. Tinha uma pequena cômoda com uma bandeja com algumas comidas em cima. Havia um telefone que era para ligar para a recepção. Tudo muito diferente do que eu vira até agora.




     Enquanto dormia tive outra empatia espectral. Nela, fui para o palácio de meu pai. Ele estava sentado em seu trono.
      — Pai — chamei — aonde nós devemos ir agora?
    Ele pareceu não me escutar. Parecia que ele estava brigando com alguém que eu não podia ver. Pouco depois, eu mudei de lugar.
    Agora estava em uma caverna. Lá dentro tinha um homem sentado em uma cadeira de pedras. Ela parecia um trono. Ao lado dele estava um centauro.
     O homem, aparentava ser de idade avançada. Uns 50 anos. Seus cabelos eram brancos espetados para cima. Um de seus olhos era tapado por um tapa olho. O outro, era cinzento, com uma expressão de ódio. Tinha uma barba rala branca. Usava uma camisa xadrez branca e um sobretudo preto. Usava uma calça marrom, daquelas de exército com uns 100 bolsos, e um sapato preto. Usava luvas de iam até a metade dos dedos. Em sua cabeça tinha uma boina preta.




     O centauro era metade um cavalo negro. A outra metade era a de um homem também negro. Seus cabelos eram raspados. Não tinha barba e estava sem camisa. Em suas costas tinha um arco e várias flechas. Eles conversavam.
     — Nosso esquadrão foi aniquilado, senhor — disse o centauro.
    — Maldição! — Disse o homem — já começamos a perder a guerra! Rápido, envie um novo esquadrão, dessa vez não falhe!
     — Sim... sim senhor!
     — Antes de você ir, o que foi que os derrotou?
     — Segundo um sobrevivente, três crianças.
    Eu fiquei gelado. Descobri que o esquadrão de quem falavam era o que tínhamos acabado de derrotar. E que eles mandariam outro para o mesmo lugar. O que haveria lá? De que guerra eles falavam? Eu não tinha visto nada enquanto estivera lá. A conversa continuou.
     — As mesmas que estão vindo para cá em uma missão de nos derrotar? — perguntou o homem.
     — Sim senhor. — disse o centauro.
   Gelei mais ainda. Quem mandara o esquadrão fora o semi-deus que eu teria de derrotar.    Ele já sabia sobre nós. Mas como?
    — Acho que as subestimei. — disse novamente o homem — Preparem postos de defesa, pois eles tem o fio e logo virão para cá. Pegue duas cópias do fio e vá para dois locais : o acampamento miserável de semi-deuses e para a guerra. O que vai para a guerra tem que ser três vezes maior e mais forte que o anterior pois eles vão encontrar com as três crianças no caminho. Agora, vou invocar meu novo exército. Com licença.
      — Sim senhor. Estarei esperando para atacarmos.
     Enquanto o homem saia da sala eu acordei. Arthur ainda não tinha acordado. Peguei o celular e liguei para Alfeu.
     Expliquei tudo a ele e pedi que mandasse reforços para onde estávamos. Ele disse que mandaria todos os filhos de Ares, metade dos filhos de Hefesto, entre eles Laio e Hugh.    No total, uns 50 semi-deuses.
     Acordei Arthur e Rachel e contei tudo a eles.
    — Temos que voltar para lá imediatamente. Esqueça o ônibus. O que me intriga é que eles tem outros fios que podem guiar dentro do túnel. Mas como?
   — Não sei — disse Arthur — mas, ao final dessa missão, se ela for bem-sucedida, descobriremos.
     Pegamos nossas coisas e fomos ao aeroporto. Ainda não sabíamos que cidade pegar até que tive uma ideia que eu deveria ter tido a muito tempo: pesquisar na internet a localização da mineradora for life.
     Fomos até uma lan house dentro do aeroporto e entramos em um computador. O nome da cidade onde ficava a mineradora era Tacna.
    O voo só saia no final do dia. Compramos a passagem e fomos passear pela cidade. Compramos roupas novas, tênis para eu e Arthur, e um chinelo para Rachel, fomos ao cinema para nos deixar mais calmos. Voltamos ao aeroporto à noite e pegamos o avião.
   Chegamos de madrugada e, lá estava ela, quase que totalmente vazia. E, lá estava também, a mesma mulher que nos levara ao labirinto. Saquei minha espada e cheguei por trás dela. Golpeei-a, mas, o golpe não a feriu, e onde eu ataquei, por baixo das roupas, tinha uma armadura.
     Quando ela sentiu o golpe, ela começou a se transformar, sua pele foi se enchendo de escamas, ficando verde, ela se virou para mim, e seus olhos eram iguais aos de uma cobras, sua língua também. Ela crescia um pouco fazendo com que suas roupas rasgassem e sua armadura aparecesse por completo. As pernas se transformaram em uma cauda de cobra cada uma. Sua armadura era de couro, mais parecia um colete à prova de balas pois ia apenas até a cintura. Seus cabelos passaram de loiro a um preto esverdeado. Era uma dracaenae.



       Ela retirou duas espadas de uma bainha e veio para cima.
     — Vocêsss de novo? — sibilou ela com uma voz muito diferente da primeira vez quando era uma jovem moça — agora não vou deixar vocêsss passsarem. Vocêssss sssserão meu jantar!
      Aquilo me revirou o estômago. Rachel foi a primeiro a atacar. Atirou uma flecha . Mas ela parou na armadura. Atirou outra e , para a minha surpresa, ela segurou-a com uma mão e a quebrou como se fosse um pedaço de isopor.
       — O que vocês estão esperando? — gritou Rachel — Ataquem!
    Aquele grito me tirou do transe em que estava. Arthur já estava atacando quando comecei a lutar. As espadas da dracaenae não eram de ferro ou alguma coisa assim, era de algo diferente, que, pouco depois, eu iria saber que era mais forte do que as espadas comuns.
    Rachel, que estava com facas na mão, atacou e rasgou um pedaço da armadura da dracaenae que contra-atacou, rapidamente, as facas de Rachel se transformaram em um escudo que parou o ataque. Ataquei por trás, no ponto cego. Ela, de alguma maneira, me viu e atacou, fiquei tranquilo, pois era quase invulnerável e, por mais forte que fosse o golpe, o máximo que faria seria uma arranhãozinho.
     Como eu estava errado. A espada dela atravessou minha barriga. Senti-me tonto na hora. Empurrei-a para tirar a espada dela e soltei minha espada para por a mão no ferimento. Minha visão embaçava. Ajoelhei-me ouvi alguns ruídos como se fosses falas.
      — Gabriel! — gritava Rachel.
     Mesmo coma visão embaçada, pude ver ela chorando. Caí no chão com o rosto para o lado. E, antes de eu desmaiar, vi vários vultos chegando da direção da cidade e alguns correndo para cima de mim. Aí, apaguei.
      — Ai — falei acordando e pondo a mão em minha barriga que parecia estar enfaixada.
     — Gabriel ! — disse Rachel ainda com lágrimas nos olhos. — você está bem!
     — Acho que sim — disse a ela meio embaraçado. — o que eu perdi?
     — Bom, não muita coisa. Quando você desmaiou, nossos amigos do acampamento estavam chegando. Eles se dividiram para cuidar de você e para lutar com a dracaenae. Mas ela era boa. Resistiu até que o outro exército, o dela, chegasse. Agora está acontecendo uma batalha lá fora.




     Eu estava em uma barraca de lona verde, parecida com aquela dos hospitais de plantão do exército, eu estava deitado em um colchonete no chão com Rachel sentada ao meu lado.
      — E você está aqui só por mim? — falei.
     Ela corou.
     — É, me preocupo por você e, já que alguém tinha que ficar aqui...
    Eu já não sentia mais dor, acho que por causa de algum remédio especial que eles me deram. Levantei-me e peguei minha espada e meu escudo.
     — Vamos à luta? — chamei oferecendo a mão para Rachel.
   Levantei-a e saímos. A batalha tinha dimensões muito maiores do que eu pensava. Rapidamente me juntei a ela e comecei a lutar.
     — De onde veio tanta gente? — perguntei eu — lá no acampamento não tem tanta gente assim!
      — Tem vários acampamentos pelo mundo! — disse Rachel — não só o nosso. Do nosso pessoal só veio Laio, Hugh e os meus meio-irmãos.
     Fiz uma careta e voltei a lutar. Tinha esfarelado uns 20 monstros quando avistei a dracaenae. Pensei que se aquela lâmina fizera aquilo comigo, o que poderia fazer com qualquer outro.
     Avancei para ela. Surpreendi-a e a golpeei na barriga. Minha espada atravessou toda a sua armadura mas não a feriu muito. Ela sibilou para mim com uma cara de surpresa.
      — Como você esssstá vivo? — disse ela.
   — Você acha que aquele golpezinho com aquela sua espadinha que mais parece de plástico ia me matar?
    Isso a fez espumar de raiva. Ela veio para cima de mim. Aparei seu golpe com minha espada e ataquei com meu escudo. Ela caiu no chão mas, se levantou rapidamente.
    Criei um pouco de água e joguei nela em um jato. Ela cambaleou. Pareceu se engasgar um pouco com a água. Ataquei de novo. Dessa vez, indo para cima dela. Quando a acertei, ataquei-a imediatamente, acertando-lhe um golpe direto. Ela conseguira colocar a mão na frente impedindo que cortasse sua cabeça fora. Três de seus dedos foram cortados, além do profundo corte em sua palma. Ela não poderia usar mais duas espadas.



    Ela assoviou e, no mesmo instante, apareceram dois minotauros à seu lado. Eu tomei distância para pensar na situação. Como poderia haver dois minotauros?
Ao longe, vi Arthur e corri até ele.
     — Arthur —disse eu arfando — venha me ajudar.
     — Com o que? — perguntou ele.
    Quando eu ia responder, um minotauro acertou-me com sua cabeça jogando-me longe. Arthur pegou suas adagas.
    Ele conseguiu acertar as costas do minotauro, cravando uma das adagas nela. No momento em que ele retirou, jorrou um líquido preto, formando uma poça no chão. Ele ajoelhou-se e Arthur atravessou seu focinho com a outra adaga. E, de novo, um brilho surgiu em seu peito e ele desapareceu.
     Investi contra o outro. Ele parecia mais ágil. Desviou-se de meu golpe e contra-atacou. Fui acertado em cheio mas consegui me levantar. Ataquei de novo. Tive a impressão de que o minotauro rira para mim. Ele se desviou e atacou com seu machado. Dessa vez me defendi. Rolei para perto de Rachel que também estava por ali.
     — Preciso de cobertura — disse eu agachado.
    No mesmo momento, Rachel colocou sua espada em sua pequena bolsa mágica, e pegou novamente seu arco. Corri para cima do monstro. Enquanto corria, escutei várias flechas zunindo em meu ouvido ao mesmo tempo. Olhei para o minotauro e ele estava com umas 6 flechas em seu corpo.




      Tomei mais impulso e usei as flechas como escada, subindo na cabeça do monstro. Seus braços eram curtos demais e não me alcançavam. Eu riria dessa situação, mas estava em um momento um pouquinho sério. Ele se balançava para me fazer cair, ms eu me segurava firme em seus chifres.
      Precisava fazer alguma coisa. Não podia ficar ali para sempre. Olhava para os lados e via uma grande guerra acontecendo e, eu, pendurado em um monstro.
  Juntei força em minhas mãos e braços e me joguei para cima soltando minhas mãos dos chifres e enroscando meus pés. Rachel já estava por trás do monstro e atirou uma flecha em sua perna, fazendo-o ajoelhar. Usei isso para me equilibrar e ficar de pé. Ele não iria se levantar de novo. Guardei meu escudo e segurei a espada com as duas mãos, cravando-a em sua cabeça. Seu peito brilhou e ele desapareceu.
     Procurei pela dracaenae. Ela olhava para mim com um olhar de extremo ódio. Dessa vez, ela é que investiu contra mim. Antes que ela chegasse perto , Algo parecido com uma bola de energia a acertou jogando-a no chão e fazendo um grande ferimento em sua barriga. Olhei para o lado e vi Laio com alguma coisa em seu pulso. Algo em forma de um escudo. Mas não como os escudos normais. Não era redondo, tinha uma forma triangular, com uma espécie de cano em sua frente mirando para a Dracaenae. Parecia que aquilo é que atirara. Ele também empunhava uma espada. Movi a cabeça cumprimentando-o. Ele também. Levantei-me e fui para a dracaenae.
         Mais uma vez, ela assoviou e apareceu um monstro para ajudá-la. Um manticore.
      O manticore era um monstro vermelho, de mais ou menos uns 3 metros. Ele tinha patas como as de um leão, só que muito maiores. Seu rosto era algo totalmente diferente do que eu já vira. Tinha olhos apenas pretos, apenas buracos no rosto ao invés de nariz e seus dentes cortariam um cabelo ao meio de tão afiados. Seu corpo era grande e peludo. Ele tinha uma cauda que, na ponta, parecia um cabelo com frizz, mas eu sabia que aquilo lançava espinhos mortais.



    Arthur e Laio já estavam ao meu lado prontos para combate. O monstro começou atacando uma saraivada de espinhos que, com meu escudo, protegi eu e Arthur. Laio se protegera também com um escudo que se parecia muito com a arma que ele acabara de usar para atingir a dracaenae. Laio apertou algo no cabo de sua espada e a lâmina foi se encolhendo e aparecendo na parte de baixo da espada, só que em forma de cabo. Depois, Laio segurou esse cabo e, o que antes era o cabo da espada, agora era uma pequena lâmina triangular. Ele empunhava uma lança. Me surpreendi com aquilo mas não deveria esperar menos de um filho de Hefesto.
      Rachel contra-atacou com uma flecha de fumaça. Foi uma ideia boa e ruim ao mesmo tempo. A parte boa era que o manticore não nos via e acertava flechas em seus próprios companheiros de batalha. A parte ruim era que os espinhos dele acertavam nosso companheiros também.
     Parti para cima pois enquanto ele estivesse na fumaça eu poderia me aproximar em segurança e, no corpo-a-corpo ele não seria tão bom. Laio pareceu ter a mesma ideia e correu junto comigo. Cada um por um lado, atacamos, mas o mostro conseguiu se defender. De mim, com sua cauda e de Laio com uma das patas. Outra flecha zuniu no ar. Ela acertou a perna do manticore. Mas não perfurou seriamente. Ele se recompôs rapidamente e voltou a atacar. Mas dessa vez estávamos perto demais para atacar seus espinhos.
      Quando pensei que estávamos em vantagem, ele me surpreendeu e me mostrou que no corpo-a-corpo ele era igual ou talvez melhor do que no ataque à distância. Ele usava as patas, os dentes, a cauda. Isso era muita coisa para conseguirmos defender e atacar ao mesmo tempo. Mas, se nos afastássemos o único que poderia atacar seria Rachel e a mira dela era um tanto quanto boa.
      Arthur pareceu ter percebido nossa dificuldade, e foi até nós. Ele atacava e desviava habilmente dos ataques do monstro, dando-nos vantagem temporária.
    O manticore estava desnorteado e não sabia quem atacar. Achei que fosse nossa vitória quando Laio saltou para cima dele com a lança pronta para ser fincada em suas costas. Como eu estava errado. Ele viu o movimento de Laio e se antecipou, contra-atacando antes mesmo do ataque dele. Vi apenas um movimento rápido de sua cauda e Laio caindo no chão. Corri até lá. Seu escudo estava cheio de espinhos do manticore, mas sua barriga também tinha alguns. Ele ainda conseguira se defender. Pelo menos parcialmente. Ele retirou os espinhos de sua barriga e se levantou.
      — Você não devia... — disse eu.
      — Estou bem — garantiu ele. — vamos lutar.
     Ele pegou seu escudo e acoplou à lança, o cabo se transformou em uma lâmina e, pouco depois, o que era uma lança e um escudo, agora era uma espada de duas mãos. Cada coisa do pessoal de Hefesto me impressionava.
    Voltamos até Arthur que estava distraindo o monstro enquanto eu ajudava Laio. Mas havia mais alguém com ele que eu logo reconheci: Rachel.
     Agora o time estava completo. Não podíamos perder. Exceto pelo fato de que outros 2 manticores estavam se juntando à festa.
     — Reagrupar! — falei.
    Arthur, Laio e Rachel chegaram perto mim. Enquanto isso, os manticores se distraíram com a guerra.
     — Temos que montar uma estratégia — eu disse — Rachel...
     — Pode deixar — disse ela. — Mas, tenho que pensar um minutinho.
     — Não temos tempo! — disse Laio.
     — Já sei — disse ela novamente olhando friamente para Laio. — Vocês três avançamos juntos e eu fico dando cobertura. Quando chegarmos perto, eu atiro uma flecha com uma bomba de fumaça, encobrindo-os. Ar partir daí vocês se viram. Mas tem que ser um em cada um. Ah, e tente fazer com que eles não fiquem lado-a-lado pois assim, seus espinhos não machucarão seus companheiros, façam com que eles atirem uns nos outros.
     — O.k. — disse eu — mas... e a dracaenae?
     — Ela está fraca demais para lutar — disse Arthur. — não devemos nos preocupar.
    Fizemos a formação e atraímos os manticore. Como imaginávamos, eles ficaram lado-a-lado. Começamos a correr, sempre mudando de posição uns com os outros, mas sempre com o alvo fixo. Essa nossa movimentação confundia os manticores.
     — Agora! — gritou Rachel.
     E quase no mesmo momento uma flecha acima de nós e caiu na nossa frente, explodindo-se em fumaça. Fomos cada um para o nosso alvo, embora não os víssemos direito. Pulei em um quando ele se preparava para soltar uma rajada de espinhos. Consegui desviar sua cauda. Seus espinhos foram para o chão. Dei um golpe de espada na cauda e de lá, saiu uma grande quantidade de sangue, saindo a pele e a carne, mostrando dentro da cauda. De dentro da carne ia saindo espinhos que ficavam armazenados no lugar onde deveria ter um osso.
     Quase caí devido a essa distração. Consegui me segurar. O manticore não conseguia mais atacar com a cauda, então, eu estava seguro em suas costas, pelo menos de ataques mortais. Finquei a espada em suas costas e ele guinchou. Vi os espinhos saindo da onde estavam e subindo para a pontada cauda. Quando ela fez o movimento de atirar, eu cortei-a, e quando fiz isso, os espinhos saíram em várias direções, mas, a maioria, foi para um manticore ao meu lado. Vários espinhos perfuraram-no. Foi então que eu percebi algo: não havia ninguém lutando com ele. Procurei freneticamente por alguém até avistar Rachel caída no chão, ao seu lado, Arthur se levantava. O que ela estava fazendo lá?
       Pulei das costas do manticore que estava praticamente morto, dei um golpe fatal em sua cabeça e corri até Rachel.
      Ela estava desacordada, com vários espinhos em seu corpo. Arthur pegou-a e a levou para a enfermaria correndo. Eu já tinha lágrimas em meus olhos.
      Me virei para o monstro. Eu sentia tanta raiva que me sentia como se fosse explodir a qualquer momento. Investi para cima do maticore . No começo eu estava correndo, mas depois, eu estava sendo carregado por um pouco de água que eu acho que fora eu que criara.



      Perto dele, pulei para fora do jato d'água que estava embaixo de mim e ele atingiu o manticore violentamente. Ele cambaleou. Fui para cima, golpeei com minha espada mas ele se defendeu e me bateu com sua pata. Fui arremessado. Consegui cair de pé. O manticore já preparava um ataque.
      Ele balançou sua cauda e os espinhos vieram. Antes que eu pudesse me esquivar, a água se ergueu à minha frente como um muro e parou os espinhos. Eu podia ver seu volume aumentar.
      Fiz um tornado d'água que atingiu o manticore em cheio. Corri para atacá-lo de perto novamente. Dessa vez consegui. Cortei seu peito.
     Mal eu atacava, e a água já se levantava e atacava também. Ela atacava de várias maneiras, desde jatos d'água até gelo.
      Vi o manticore rindo para mim e sua boca desenhando uma fala: ela está morta. Perdi o controle da minha consciência e a última coisa que vi foi o céu se escurecendo e algo como uma grande onda se erguendo.
     Acordei e estava na enfermaria. Pela primeira vez depois de ter liberado a fonte divina de energia, eu estava cansado. Olhei pelo vão na parede que tinha ao lado da minha cama e vi várias poças d'água e muitos monstros caídos no chão. Havia também algumas pessoas do nosso exército verificando a veracidade da morte dos monstros do exército inimigo.
       Procurei por Rachel. Ela não estava lá. Devia ter se recuperado e estava para fora com os outros. Me levantei e cambaleei para fora.
     Fui até o quartel onde eram feitas as estratégias e lá estava Hugh, e ao lado dele, Arthur, aparentemente chorando.
     Quando ele me viu, eu estava olhando para ele esperançoso, mas, ele olhou para mim com tristeza e balançou a cabeça em um sinal de negativo. Seu olhar também me pedia desculpas. Senti as lágrimas emergirem em meus olhos. Não podia ser verdade aquilo. Meu coração queimava. Saí correndo de lá e fui até a porta do labirinto. Fiquei sentado lá por um longo. Meus pensamentos não me obedeciam. Eram uma mistura de tudo que fora Rachel para mim, naquele pequeno convívio que tivemos. Seu jeito de ser, sua timidez ao falar comigo, sua destreza na batalha, sua inteligência nas estratégias... 



Aquilo não podia ter acabado. Ela não era a filha de um deus? Era assim que terminaria a vida da mais maravilhosa filha de um deus?  Uma avalanche estava dentro de mim, arrazando tudo, acabando com toda a esperança... Não sei quanto tempo fiquei ali até que Arthur me chamou.
     Fomos até uma barraca improvisada. Havia algumas tochas iluminando o local, pois já era noite. O chão tinha vários tapetes que cobriam todo o chão. Havia muita gente lá. E, bem no centro, alguns corpos cobertos por um pano.
     Uma cerimônia começou. Hugh falava um discurso sobre como as pessoas mortas foram importantes na vida de todos, mas eu não prestei muita atenção. Ele terminou seu discurso e os rostos dos corpos começaram a ser descobertos. Não reconheci ninguém até descobrirem o último rosto. Era o de Rachel. Estava branco, muito mais do que ela era.
     Arthur apareceu ao meu lado e abriu os braços pedindo um abraço. Abracei-o.
     — Foi culpa minha — ele disse chorando — eu podia ter impedido.
     — Não foi culpa sua — disse eu tentando tranquilizá-lo — você deu o melhor de si, não se culpe.
    Fomos até Rachel. Todos do nosso acampamento estavam chorando. Principalmente eu e Arthur.
    — hum, hum — pigarreou Hugh nos chamando — vocês devem partir para concluir a missão de vocês.
    — Ah, sim — disse Arthur — com certeza, eu acabo de perder minha melhor amiga e vou sair assim, sem mais nem menos?
     — Calma Arthur — disse eu — sei que está triste, eu também, mas devemos fazer isso, ou então vamos perder todos os outros.
    Arthur hesitou, abriu a boca para falar, mas fechou-a como se tivesse mudado de ideia.    Ele abaixou a cabeça.
     — Quero que Laio vá conosco. — disse eu.
     — Ele não pode — disse Hugh — ele tem que ajudar lá no acampamento.
    — Tudo bem então — disse eu — se você quer proteger o acampamento ao invés do mundo, claro, vá em frente!
    — Acho que você me convenceu — disse ele. — Vou avisá-lo e vocês partem amanhã. Agora, vão dormir pois vão precisar de energia.
       — Não vamos amanhã. — disse eu — vamos depois da cerimônia de entrega.
       — Mas vocês vão perder tempo e...
       — Já está decidido. Ficamos até depois da cerimônia.
       Hugh resmungou algo e saiu. Acho que ele havia deixado eu ficar até a cerimônia.
     A cerimônia de entrega era uma cerimônia que acontecia quando um campista morria. Os chefes do acampamento pegavam uma espécie de túnica que todos tinham e a queimavam em sinal de que estavam entregando o espírito da pessoa morta para Hades e, ao mesmo tempo, pedindo para que a pessoa não sofresse no mundo inferior.
    Ele não precisou falar duas vezes, me virei e fui para um dormitório de lona improvisado. Dormi como uma pedra. Quer dizer, enquanto consegui dormi, pois logo acordei pensando em Rachel.
      — Também está pensando em Rachel? — sussurrou Arthur.
      — Ah, sim. Você não conseguiu dormir também? — sussurrei de volta.
      — Não. Vou sentir muita falta dela.
      — Eu também.
     No mesmo momento pensei em meu sonho quando vi eu e ela numa cadeira de balanço quando velhos. Acho que era só um sonho, pois se aquilo estivesse me mostrando o futuro, eu não teria visto aquilo.
    — Ela me contou um sonho que teve — continuou Arthur — viu vocês dois juntos quando velhos. Mas eu acho que era só um sonho. Pois ela está...
    Ele não conseguiu terminar a fala.
    — Espere. Eu também tive esse sonho. Não pode ser só um sonho. É muita coincidência.
    — Não pode ser. É muita coincidência mesmo. Tem algo muito estranho nisso. Mas, o que importa é que Rachel morreu e esse sonho não pode se realizar.
   Depois dessa conversa, conseguimos dormir. Eu acordei só na manhã seguinte. Estava tudo parado. Tudo normal demais para o que eu me acostumara. Saí do dormitório e vi que o local estava cheio de poças e estava embarrado. Estranhei pois me lembro que na luta não havia chovido nem um pingo d'água e o céu estava sem nenhuma única nuvem.
     — Bom dia — disse Arthur.
     Sua expressão era triste, de que ele não estava tendo um bom dia.
     — O que aconteceu aqui? — perguntei eu.
     — Ah, uma guerra e...
     — Não, eu falo dessa água no chão.
     — Você não se lembra?
     — Não. Por que eu deveria lembrar?
     — Por que foi você quem fez isso.
     — Eu? Mas, Como?
   — Você estava lutando com o manticore e seus olhos ficaram sem cor, totalmente brancos. Então, uma onda gigante apareceu e começou a rodar em volta de você. Você estava com os braços abertos. Eu posso jurar que essa onda tocava o céu. Depois, você a chocou contra todos e, para a nossa surpresa e sorte, apenas os inimigos tinham sido acertados e “varridos” do lugar. Acho que foram jogados para dentro do labirinto.



     — UAU!
     Esbocei um sorriso mas lembrei-me de Rachel e rapidamente essa ideia foi esquecida.
     — E agora — disse eu, — o que vamos fazer nesses dois dias que vamos ficar aqui?
     — Não sei — disse Arthur — só sei que vai ser aqui. Sem ela...
    E realmente não foi fácil. Os dois dias até que passaram mas foram se arrastando lentamente, como se o tempo tivesse ficado mais lento especialmente para nós. A coisa mais legal que fiz foi ficar brincando com a água. algo sem pensar, espontâneo. Finalmente, não que eu quisesse que isso acontecesse mas, a noite da cerimônia chegou.
    Mas, aconteceu uma coisa inesperada. Todos os corpos tinham sumido. Assim, evaporado, “puf!”, simplesmente não estavam mais lá. Será que Hades já os levara? Será que o tempo para fazer a cerimônia era de dois dias e não mais três? Todos estavam espantados e ninguém sabia o que acontecera. Todos que perderam amigos e parentes estavam despontados e desolados, pois não puderam dar um descanso verdadeiramente em paz.
     Na manhã seguinte, todo o acampamento de guerra fora desmontado e as pessoas já estavam partindo. Arrumei minhas coisas e, embora não estivesse com nenhuma vontade chamei Arthur e Laio para partirmos. Ainda era bem cedo quando saímos daquela cidade. Dessa vez iríamos direto à Roma, sem paradas nem distrações, da última vez em que saí do rumo, eu perdera Rachel.
     Pegamos três pégasos enviados por meu pai, ele já sabia da vitória na guerra e agora queria que a gente fosse para Roma o mais rápido possível. Ele disse que não poderia nos teletransportar pois estava distante de nós e, para fazê-lo, deveríamos estar junto dele.
O meu pégaso era um grande cavalo branco com asas. O de Arthur, um cavalo malhado, e o de Laio, um cavalo preto.



      Eu achava que voar de pégaso, ainda que na minha imaginação, era um coisa lenta pois o cavalo cavalgava, só que no ar. Mas, não é bem assim. Eles viajam muito rápido, a , segundo o meu pégaso, 900 quilômetros por hora.
   Sim, eu disse que meu pégaso falou a velocidade. Os pégasos falam, pensam, eles disseram que são quase humanos, só são um pouco menos inteligentes e tem forma de cavalo com asas.
    Viajamos até o anoitecer e paramos em uma cidade na costa oeste da África. No outro dia saímos bem cedo. Voamos até à tarde sem parar e pousamos em uma outra cidade.
    — Nosso chefe disse para deixarmos vocês aqui — disse o pégaso branco me descendo de suas costas.
    —Mas, porque? — perguntei eu.
    — Não sabemos, mas o nosso limite é aqui. Vamos ficar aqui. Caso precisem de ajuda ou até mesmo de uma carona de volta, use esse apito aqui.
    Ele pegou um apito com sua boca em uma sacolinha presa em seu pescoço.
   — É só assoprar — garantiu o pégaso malhado — nós ouviremos e iremos aonde quer que estiverem.
   — E, onde é que estamos? — perguntou Arthur.
   — Ora, vocês ainda não descobriram? — debochou o pégaso negro — onde mais seria? Vocês estão no...
   — Egito — completei.